quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Personalidade Nogueirense

António Rodrigues dos Santos (Nunes) nasceu a 11 de Janeiro de 1913; filho de José Rodrigues dos Santos e Maria Ludovina de Jesus.
Tio António Nunes, como é mais conhecido, nasceu numa casa situada na rua do meio em Nogueira do Cravo. Foi baptizado pelo padre Agostinho Elvas, de S.Gião.
Quando era pequeno brincava ao peão à bilharda e jogava a bola na rua descalço. “O meu pai era do Peso e a minha mãe era filha do meu avô Herculano e avó Maria, que viviam na casa do penedo. A minha avó Maria morreu tragicamente. Andava por aí um pedinte de terra em terra e ao aproximar-se dela pediu comida. Eram tempos de miséria e como não tinha nada para lhe dar em casa, subiu a uma figueira junto ao penedo para tirar figos, pois caiu dela abaixo e morreu estatelada na estrada, junto do portão da casa da cal”.
Seus pais eram de família pobre, dos rapazes era o mais velho de 8 irmãos e desde cedo todos os filhos homens foram para a “arte” para ajudar. “Tinha 12 anos quando fui para Carrapichana (Celorico da Beira), onde andei até aos 13. Depois fui para Coimbra até aos 18 anos, viver para casa do meu tio José Rodrigues, que tinha uma pastelaria. Quando regressei fui outra vez para a “arte” até à reforma.” Foi aluno do professor Carvalho e quando ia fazer o exame da 4ª classe não o chegou a concluir porque “o meu pai andava a trabalhar em Carrapichana e quando por altura da festa do Senhor das Almas aqui veio disse-me: já sabes mais do que eu, por isso vais comigo para os “panelos” o que acontecia à quase totalidade dos jovens de cá nesse tempo!
O seu pai trabalhava à sociedade com os tios Agostinho e António Nunes. “No início não ganhava nada. Cozinhava para eles e aprendíamos a “arte” de trabalhar as pedras e íamos aguçar os picos (morrões dos arguinas) às costas ao ferreiro!” Aprendeu logo os “verbos dos arguinas”, com os mais velhos. “Trabalhava-se de sol a sol e por vezes aos domingos ainda ajudávamos a mulher na agricultura.
Andou por muitos lados mas “lembro com saudade o que se construiu por muitas terras, na Carrapichana, Celorico, Vale de Estrela, onde fiz um bonito fontenário, Guarda, Vale Formoso, na construção da escola primária, Covilhã, etc. Em Oliveira também fizemos bonitas vivendas em granito. Andei também um ano na Lagoa Comprida em 1941, ano do ciclone. Ganhava-se uma miséria de 14$00 ao dia e por aqui só davam 11$00.”
Casou em 1938 com Emília Coelho, tinha 25 anos. Logo pouco tempo depois estalou a 2ª Guerra Mundial e racionaram os alimentos e passou a haver falta de trabalho “ o que nos obrigava a sair daqui procurar trabalho e por vezes a regressar meses depois. Só vínhamos à terra, no Natal, Páscoa, Sr. Das Almas, Sr.ª. Dos Milagres e na Senhora do Rosário”.
Mais tarde comprou uma bicicleta, já tinha feito 30 anos,”foi comprada a prestações”.
Conta-nos também que por volta de 1935 se iniciou em Nogueira o Operário Futebol Clube Nogueirense, do qual fazia parte como jogador. “Eu era half-centro (hoje chama-se trinco) e principia-mos a jogar no terreiro do Senhor das Almas. Depois pedimos ao Sr. Dr. António Tinoco um campo para jogar, o Pinhal das Domingas (onde estão hoje os escritórios da empresa J.Fernandes Marques e Filho). Vendeu os pinheiros mansos e fomos nós os jogadores que construímos o campo e comprámos os equipamentos completos e a bola. O Toninho do Pelourinho, com mais poder económico facilitou-nos ao emprestar-nos o dinheiro, pois o seu pai tinha uma taberna. Depois fomos pagando como podíamos…”
Desses tempos disse-nos que raramente perdiam um jogo. Desafios com Bobadela, Candosa e outras terras à volta. “Com o Oliveira é que não me lembro de lhes ganhar!...”
Deixou de jogar cedo porque “ a minha mulher começou-me a dizer se me magoasse como era depois para sustentar a casa. Por isso deixei de jogar quando começaram a nascer os filhos.”
Ainda se lembra da antiga Feira de Santiago ser realizada no Gagim. “Era feriado em Nogueira, ninguém trabalhava e havia sempre desordem. Lembro-me também dos bailes ao Pelourinho com danças à guitarra. O tio Fonseca, que andou na 1ª Guerra Mundial, era um grande tocador e animador desses serões.”
Hoje, com quase 96 anos, ainda vai com frequência às Coirelas, “gosto muito daquele lugar. Não vou lá mais vezes porque a minha família já não me deixa. Dou lá duas ou três cavadelas e fico satisfeito!
Aprecia um bom prato, principalmente feijões, e não dispensa a sopa. Não gosta de leite e derivados e às refeições bebe sempre um copinho de vinho.
Foi esta a personagem Nogueirense que foi chamada a dar o pontapé de saída no primeiro jogo no novo Estádio de Santo António.


António Nunes é o quarto em cima da esquerda para a direita. Esta fotografia foi-nos cedida por José Duque.

4 Olhares:

Unknown disse...

Esta oportuna reportagem retracta a vida difícil de muitos "Antónios Nunes", antes e após a segunda guerra mundial.
O trabalho, quando o havia e não chovia, era de sol a sol, com salários de miséria e sem protecção na doença.
O Sr. António Nunes, penso ser o mais antigo conterrâneo vivo e também o único daquela celebre equipa do Operário que teve a alegria e a merecida honra de inaugurar os jogos no Estádio de Santo António, dando o pontapé de saída. Foi a ligação perfeita da história com o presente.

Anónimo disse...

Fica registado um pouco da vida deste homem, o mais velho da terra, e também o modo de vida das nossas gentes no século passado. Menciona aqui da feira de Santiago;e porque não a Liga de Melhoramentos reeditar este evento que ao que sei já tinha muitos anos? Pensem nisso!

Anónimo disse...

Como não se ler o team do Operário na foto é o seguinte:
Em cima: Albino Nunes, João G.Alves, Pataco, António Nunes, Alemão (oriundo de Gouveia) e Chico Silva.
Em baixo: Adelino Silva, Adriano Fernandes, Toninho do Pelourinho, José Cardoso e Rêgo.

Anónimo disse...

A fotografia foi cedida pelo Zé Duque, e a entrevista elaborada, por quem???pelo MASTER?