sábado, 29 de agosto de 2009

Bicentenário do Nascimento de Bernardino - Parte I

O "Olhar Nogueira do Cravo" dá hoje início à publicação de um trabalho acerca da vida e obra do nosso ilustre Bernardino Freire Figueiredo Abreu e Castro, elaborado com o objectivo de vir a ser distribuído pelos presentes no dia da sua Homenagem, a decorrer no próximo dia 3 de Outubro.

Uma vez que esta mesma distribuição poderá ser impossibilitada por limitações financeiras, faseadamente será colocada toda a informação neste blog, existindo ainda a possibilidade de o documento ser facultado na integra por meio digital a todos os interessados.


Homenagem da sua terra natal ao ilustre Nogueirense, fundador da cidade de Mossâmedes e com notável actividade em três continentes.

Por: António Serra


BIOGRAFIA


Nasceu em Nogueira do Cravo. O seu percurso de vida desde estudante a político, militar, jornalista, exilado, professor, escritor, patriota, colono, agricultor e juiz, deixa marcas indeléveis nos continentes Europeu, Sul -Americano e Africano, culminando neste último com a fundação da cidade Angolana de Mossâmedes em 4 de Agosto de 1849, hoje chamada de Namibe, após a independência daquela nossa antiga província ultramarina.

O seu baptizado foi em quatorze de Dezembro de mil oitocentos e nove na Igreja Paroquial de Nogueira do Cravo, conforme o atesta o respectivo registo.

Nascido na rua do Saco, era filho de Alexandre Nunes Vieira de Barros e Rita Gouveia Freire de Figueiredo, neto paterno de Manuel Nunes de Campos e de Joaquina Bernarda, que moraram na Casa da Torre, também conhecida por Casa dos Mouros ou Casa do Penedo. Os seus avós maternos eram Francisco Abranches Figueiredo e Josefa Maria de Abreu, naturais de Avô. A sua ascendência remonta a D. Pedro e Dª. Inês de Castro.

A sua matriz religiosa e política, herdou-as de seus familiares, profundamente religiosos e fervorosos adeptos da monarquia vigente, vindo a tomar partido directo quando atingiu a sua maioridade e se confrontavam então os absolutistas liderados pelo seu “adorado Monarca Senhor D. Miguel” e os Liberais que apoiavam as teses do seu irmão D. Pedro.

Nos seus primeiros anos, até atingir a maioridade, terá vivido em casa dos pais, mas aos vinte anos de idade vai para Coimbra, onde se matricula na Universidade de Coimbra em 1829, frequentando os primeiro e segundo anos de Leis. Porém, o ambiente aqui vivido não era o melhor face às suas convicções políticas e, assim, abandona os estudos e envereda pela via revolucionária, nas hostes de D. Miguel, atingindo o posto de Tenente de Caçadores. Porém, não teve a sorte de seu lado, pois que este monarca foi derrotado e obrigado a sair de Portugal. Não obstante uma convenção realizada em Gavinhos, tendente a pacificar a região entre liberais e absolutistas, Bernardino envolve-se novamente nas escaramuças e participa, bem como seu irmão Alexandre, numa revolta chefiada pelo seu parente Dr. Luiz Paulino, todos naturais de Nogueira do Cravo.

Num meio tão pequeno como o nosso, só lhe restou esgueirar-se e refugiar-se em Lisboa. Com outras armas, continua a conspirar tornando-se jornalista em órgãos do partido dos absolutistas, como no Alcance e no Portugal Velho, onde terá chegado a fazer parte da redacção deste jornal, até que foram extintos por força da nova Constituição.

Com um ambiente claramente hostil, difícil em se mover, desgostoso, prefere abandonar voluntariamente o território Nacional rumo ao Brasil, do que ter de se sujeitar aos novos senhores, isto é aos liberais.

Com trinta anos de idade parte assim para o Brasil, indo fixar-se no Recife em Pernambuco, não procurando a emigração como o alvo de enriquecimento fácil, mas sim como um intelectual que, longe da sua pátria, não se subordinando ao regime que vigorava em Portugal, enveredou por uma nova actividade durante os dez anos que pôde estar no Brasil.

Começa então a leccionar no Colégio Pernambucano, onde faz parte do corpo docente e, não satisfeito com isso, dedicou-se a estudar profundamente a História, donde resultam a publicação de alguns livros de índole didáctica como a História Geral em seis volumes, o Compêndio Elementar de Cronografia e o mais conhecido neste momento e que possuímos, que é o romance histórico, descritivo, moral e crítico, com base nos encontros entre Portugueses e Holandeses de 1648 a 1649, nos montes de Guararapes, na zona do Recife, onde vivia, presumo, já que tinha o seu escritório na Rua da Cadeia Velha, n.º 3. Digamos que é a fase do professor, do intelectual, erudito e escritor.

Só que os ventos da adversidade voltam a aparecer no horizonte. O Brasil tornara-se uma nação independente, cerca de vinte anos antes e os seus naturais não vêm com bons olhos o ascendente económico e político dos Portugueses.

Surgem então “Os praieiros”, movimento de uma facção liberal que propôs a expulsão de Portugueses solteiros e a nacionalização do comércio a retalho. Surgiram tumultos e as perseguições, apelidando depreciativamente os portugueses de “marinheiros”, tornando a vida muito difícil nos últimos dois anos, para não dizer impossível, a estes nossos compatriotas.
É aqui que surge o carisma de um líder que não gosta do que vê - Bernardino Freire de Figueiredo Abreu e Castro. Faz circular pelos seus compatriotas a ideia de transmitir ao Governo Português o que se estava a passar, pedindo providências, entre as quais o transporte para um ponto das nossas possessões na Ásia ou em África onde, como colonos, se quisessem estabelecer. Não foi nada fácil, mesmo perante as atrocidades sofridas, convencer os seus compatriotas a partir. Foram quinze dias difíceis para os convencer, mas Bernardino, homem indomável, armando-se em porta-voz daquela gente, escreve ao Ministério da Marinha e Ultramar que envidasse todos os seus esforços para concretizar tal pretensão. Impôs condições que viu satisfeitas, como navios para os colonos abandonarem o território gratuitamente, com provisões para seis meses, ferramentas, utensílios agrícolas, auxílio financeiro para aquisição de maquinaria para a industrialização da cana sacarina, isenções de direitos sobre os bens, a publicação de uma lei para isentar de impostos alfandegários por dez anos, etc.
Com tudo o que é previsível salvaguardar e com as devidas garantias, lá partiram de Lamarão, do porto de Pernambuco, rumo ao sul de Angola, às quatro horas da tarde do dia vinte três de Maio de mil oitocentos e quarenta e nove em dois navios com 166 pessoas, sendo um de escolta.
Não chegaram todos, pois oito pessoas pereceram na viagem com as bexigas, sendo três adultos e cinco crianças, não obstante Bernardino ter levado, como condição para a mesma e instalação final, um sacerdote, artífices de vários ofícios, dois farmacêuticos e uma bem sortida botica.
O primeiro barco, o Brigue Douro, chega no dia um de Agosto, mas só desembarcam com a chegada da barca Tentativa Feliz no dia quatro de Agosto, após setenta e quatro dias de viagem. Há grande recepção e festa, mas Bernardino não descansa. Em dezasseis de Agosto segue no mesmo barco brigue Douro, para Luanda, onde apresenta cumprimentos ao Governador-Geral e se demora dois meses tratando de formalidades para o funcionamento da sua colónia.

De regresso a Moçâmedes, é içada a bandeira portuguesa em 21/10/1849 às 7 horas da manhã, com salva de vinte um tiros, arraial e foguetes. O local passou a chamar-se o Sítio da Bandeira e foi aí que escolheu erguer a sua habitação. Os outros colonos fizeram o mesmo noutros locais que escolheram para as suas fazendas e plantações com os respectivos engenhos agrícolas e sementes, trazidos do Brasil.

Os primeiros anos foram muito difíceis, devido à novidade de uma nova terra, com outro clima e o desconhecimento das plantações na época certa. Grassa o descontentamento e Bernardino, agora agricultor, no meio do povo exclama “ Só será salvo o que perseverar até ao fim”. E, convicto que venceria, passados dez anos, exactamente em 4/8/1859, faz no notário, a célebre Escritura de Promessa e Voto.

Entretanto nasce o município de Moçâmedes quando já existem 36 casas de pedra, oito de adobe e a capela de Santo Adrião, das primeiras construções efectuadas.

Bernardino é um precursor da abolição da escravatura pela qual se bate e aplica na sua própria fazenda escrevendo em 1857 “os poucos pretos com quem trabalho, podem hoje ser livres porque continuarão a ser úteis. Eduquei-os com boas maneiras e não com castigos bárbaros...não me agrada a distinção entre escravos e libertos, nem a admito na minha fazenda. ”E a sua postura teve eco. Portugal abolia o estado de escravidão em 1869.

Bernardino aproxima-se do fim. Nos seus escritos não deixa de perceber-se uma certa nostalgia da Pátria, de Nogueira e de sua mãe.

A década de sessenta corre muito mal a Bernardino. A sua fazenda e equipamento foram destruídos por outros povos. O Governo-geral de Angola é impotente para lhe resolver a situação criada, com ajudas e redução de impostos, para se reorganizar e recuperar. Vem a Lisboa onde se demora ano e meio pedindo apoios directamente. Regressa a Mossâmedes sem nada e só passados seis anos lhe dão resposta com despacho miserável. Não recupera dos prejuízos e dívidas dos cinco anos que ainda viveu.

Em 14/11/1871, com 62 anos de idade, faleceu, pobre, quando regressava de Luanda, ao serviço da comunidade, vítima de uma pneumonia dupla. O povo de Moçâmedes nunca o esqueceu, ao contrário da sua terra. Nunca é tarde para, ao menos, perpetuarmos a sua memória e divulgarmos o seu honroso e épico percurso de vida. A oportunidade vai surgir em Novembro do ano 2009 por ocasião do bicentenário do seu nascimento. Tem a palavra o povo de Nogueira.
Poderão, os mais cépticos, questionar o que fez Bernardino em Nogueira do Cravo, sua terra natal. Os promotores desta justa homenagem não têm dúvidas do quanto ele fez por Nogueira do Cravo. Lendo as fonte impressas a que no final fazemos referência, os muitos textos que circulam na internet, o reconhecimento do mérito pela diáspora angolana, ou ainda o que dele escreveu o poeta Padre Gil Duarte “

8 Olhares:

Anónimo disse...

Sérá que ainda é Ascendente da familia 'Nunes' de Nogueira do Cravo? Se assim for têm muita história para contar e, até poderá ter descendentes não directos.

Master disse...

Em breve será publicada toda a informação referente à descencência de Bernardino, sendo esta mesma informação parte constante do mesmo trabalho. Fique atento e obterá resposta à sua interrogação.
Saudações Nogueirenses.

Anónimo disse...

Independentemente do mérito da homenagem seria bom, em favor de uma correcta informação, que se enquadrasse completamente este homem no seu tempo. Não nego os méritos de alguns dos seus actos, mas tal não poderá servir nunca para branquear o facto de este personagem ter estado no lado errado da história portuguesa. Não podemos esquecer que o paradgima que criou as sociedades ocidentais tal qual hoje as conhecemos tem nas Revoluções Liberais do início do Séc. XIX um momento de primordial importância. Não podemos esquecer que este Sr. acreditava que o Rei era Deus na terra. O que no presente caso queria dizer que D. Miguel seria Deus na terra. Sendo que D. Miguel não é alguém de que a história portuguesa tenha muitos motivos para se orgulhar. Num momento em que os descendentes de D. Miguel, através do Duque de Loulé, andam a reclamar o direito a herança da coroa portuguesa era bom, em nome dos valores da liberdade e da cidadania que se tivesse o cuidado de não esquecer uma parte da história. Não se vá correr o risco de "endeusar" as ideias em vez do homem.

De resto existem em Nogueira memórias e pessoas que tal como Bernardino, podem não ter feito muito pela terra em si, mas que deixaram a sua marca no lado correcto da história e e dos valores atrás referidos.

É só procurar um bocadinho.....

Ass: Francisco Pereira.

Anónimo disse...

concordo com o anterior ,e é pena que se esqueça uma parte importante da vida deste senhor ,quando das lutas liberais do seu tempo se aliou ,ou fez parte das alas absolutistas .se poderem leiam as suas intervenções no convenio de gavinhos ,e nos livros da epoca ,dos quais saliento as memorias de joao brandao ,terror da beira ,assassinos da beira ,jornal o conimbricense e verifiquem os crimes de que este homem é acusado ,ok foi vitima do seu tempo ,e quem somos nós para o julgar ,de actos de a 150 anos a trás ,mas que foram responsaveis por a forma de organização e estratificação social onde vivemos hoje .Mas não se deveria saber mais sobre algumas passagens da sua vida durante as guerras liberais ?
penso que sim ,e esta terra tem de certeza figuras mais ilustres e estão esquecidas .
possuo alguma bibliografia da epoca da vida de bernardino de castro que poderei ceder para investigação ,seria bom que tal fosse feito .

toze cardoso

Unknown disse...

Ao Sr. Tozé Cardoso
Por vezes os Nogueirenses, gostam de dizer mal de tudo, são derrotistas, não valorizam o que de bom e muito, existe. Pelo contrário.
Pode-se discordar, interpretando ocorrências da nossa história, agora que, passados quase 200 anos, estamos no limiar do sec. XXI.
Agora deturpar factos, eventualmente para confundir, não, senão vejamos:
João Brandão nasceu em 1827, quando Bernardino, já homem, entrava para a via revolucionária.
João Brandão tinha 9 anos, quando da convenção de Gavinhos. Que terá ele a ver com a luta entre absolutistas e liberais. Nada, claro. Seu pai sim, mas não pelos bons exemplos, como deve saber.
João Brandão tem uma vida atribulada, envolvido em bandos, tendo sido condenado, por crime, no tribunal de Tábua a 3/6/1869.
João Brandão e suas gentes, encostou-se ora ao partido progressista, ora ao partido regenerador, ora ao partido Histórico. Tudo isto, já com Bernardino em Brasil e Angola.
No entanto, João Brandão entrou na cultura popular. Bandoleiro? Revolucionário? Guerrilheiro? Algo de positivo os Tabuenses viram nele, para darem o seu nome à Biblioteca Municipal.
Tão diferente foi a vida de Bernardino e ainda assim, alguém a questiona.
Ao contrário, este nosso conterrâneo, não vencendo a sua tese, exila-se, entra na docência no Brasil, continua a defender causas e vai para Angola, por patriotismo e solidariedade, morrendo pobre.
Trocou uma vida cómoda, dentro de uma família honesta, com notoriedade e prestígio, por uma vida de luta ao serviço do próximo.
Qualquer colação do comentário à vida de João Brandão, salientando as suas memórias, terror e assassínios, é um péssimo exemplo para esclarecer e unir o povo de Nogueira do Cravo.

Anónimo disse...

caro antonio

penso que não entendeu bem as minhas palavras,lembrei-lhe apenas alguns livros da epoca ,relacionados com esta região e suas figuras e um deles são" as memorias de joão brandão por ele escritas na prisão do limoeiro" ,onde descreve uma serie de acontecimentos desta região na epoca,vai-me desculpar mas não entendo que tipo de comparação está a fazer?
disse-lhe apenas que seria bom uma investigação mais aprufundada da figura de bernardino ,sua epoca e contexto social em que viveu ,nomeei-lhe uma serie de bibliografia interessante como lhe poderia nomear mais para a construção e enquadramento social da epoca em que esta figura viveu .
meu caro se interpretou mal as minhas palavras ,tenho de lhe pedir desculpa ,mas em ponto algum fiz comparações entre estas duas figuras beirâs que apesar de serem motivo para forum de discussão e até sua interligação historica de factos e casualidades da vida que os uniram e separaram .
meu caro antonio ,tentei colaborar ,complementar e dar -lhe algumas ideias para a melhor compreenssão da figura de bernardino de castro ,porque entendo que mais se deveria saber ,escrever e discutir sobre a sua figura .
não é ,nunca foi ,nem será meu objectivo ,dizer mal ,unicamente devemos elucidar as pessoas para uma melhor compreenssão da vida do homem que foi bernardino de castro e esclarecer todas as duvidas sobre a sua figura .
caro amigo ,mais uma vez lhe lembro ,que não estou a discordar das suas opinioes ,unicamente lhe digo de forma construtiva que se poderia melhorar a explicação e enquadramento historico social da vida de bernardino de castro para uma melhor compreenssão da parte de todos .já pensou em criar o debate sobre a figura de bernardino de castro? e fazer uma investigação mais aprofundada se calhar com uma exposição aos nogueirenses com documentos ,factos ,pessoas ,etc.Aí defendo que depois do conhecimento da sua figura ,sua discussão e dar a conhecer aos nogueirenses ,coisa que a maioria desconhece quem foi bernardino de castro ,se poderia fazer a dita homenagem .caso o entenda estou disponivel a colaborar consigo nessa empreitada.
abraço amigo ,sempre disponivel

toze cardoso

Anónimo disse...

Só uma rectificação: D.Duarte de Bragança é bisneto de D.Miguel! (duque de Loulé reclama por outra via)

Anónimo disse...

Obrigado pela correcção. O que queria dizer era: Num momento em que os descendentes de D. João VI, através do Duque de Loulé, andam a reclamar o direito a herança da coroa portuguesa era bom, em nome dos valores da liberdade e da cidadania que se tivesse o cuidado de não esquecer uma parte da história.
Em momento nenhum pretendi defender D. Duarte Pio ou os membros da linha Miguelista. Que foram banidos pela constituição de 28 da sucessão ao trono. O que de resto é perceptível no resto do texto. As minhas desculpas pelo erro.

Ass: Francisco Pereira.